Na noite de 2 de março de 2023, a engenheira Letycia Peixoto Fonseca, de 31 anos, deixava sua mãe em uma rua de Campos dos Goytacazes, quando teve o carro cercado por dois homens em uma moto. Grávida de oito meses do menino Hugo, Letycia foi atingida por cinco tiros e morreu. Seu filho chegou a nascer quando ela foi socorrida ao hospital, mas também morreu no dia seguinte ao crime. O acusado de ser o mandante era seu então companheiro, o professor Diogo Viola de Nadai, que está preso. Um ano depois, Cintia Pessanha Fonseca, mãe de Letycia, diz que "não é nada fácil" conviver com a dor e que o que lhe dá forças para seguir em frente é para "buscar justiça" pela filha e pelo neto.
Para além de socorrer a filha, Cintia ainda foi atingida por um disparo na coxa naquela noite, o que a faz sentir dormência no membro esporadicamente hoje em dia. E se os efeitos se manifestam fisicamente, o trauma vai além: a mãe foi testemunha ocular de cada disparo que atingiu a filha e, em meio ao sangue, ainda foi quem tentou reanimá-la, enquanto a transportava para o hospital.
— Não tem como esquecer. Acordo e durmo pensando nisso. A gente fica questionando como alguns segundos mudaram uma vida inteira, ou o porquê de tanta maldade e frieza. — desabafa Cintia. — Vou ficar com esse buraco eternamente, porque foi uma coisa que me arrancaram: minha filha não teve direito de defesa.
Professor de Química, Diogo Viola de Nadai conheceu Letycia quando ela foi sua aluna, há quase 10 anos. Eles viviam um relacionamento conturbado, segundo a família da vítima, e foi preso no ano passado, acusado de ser o mandante do crime. À época, por exemplo, a polícia identificou em seu celular pesquisas sobre o assassinato da engenheira, assim como buscas de como resetar o aparelho.
Além dele, foram presos os ocupantes da moto — Dayson dos Santos Nascimento e Fabiano Conceição Silva — assim como aquele apontado como um intermediário, Gabriel Machado Leite. Segundo o Tribunal de Justiça do Rio (TJRJ), "os réus foram pronunciados para serem julgados pelo Tribunal do Júri", o que significa que irão a júri popular, ainda sem data definida.
No entanto, a defesa entrou com um recurso. "Os autos oportunamente serão encaminhados ao Tribunal de Justiça, que decidirá se mantêm ou não a referida sentença de pronúncia", informa o TJRJ.
— Nós sabemos que o tribunal do júri é soberano, onde os jurados votam sem justificar o porquê de condenar ou absolver. Mesmo sabendo que o tribunal vota como bem entender, nós, da acusação, estamos confiantes na condenação, diante de todo acervo probatório e provas que temos nos autos — observa o advogado Márcio Marques, assistente de acusação no processo.
Segundo o advogado, Diogo (mandante), Dayson (piloto da moto usada no crime) e Fabiano (garupa da moto) tiveram a prisão preventiva mantida, enquanto Gabriel, o intermediário, passou à prisão domiciliar, com monitoramento eletrônico, por justificar ter dois filhos com deficiência.
Homenagens: Sobrinha de Letycia nascerá neste mês e receberá seu nome; pai da engenheira faz tatuagem com rosto da filha
Entre os parentes de Letycia, quem mais sofreu os efeitos de sua morte foi sua tia-avó, Simone Peixoto, de 51 anos, que tem Síndrome de Down. No dia do crime, ela ocupava o banco do carona do carro da engenheira e, enquanto Cintia desembarcou do veículo para abrir o portão, Simone esteve ao lado da sobrinha-neta durante todos os disparos.
Mesmo tendo se sujado com o sangue de Letycia, Simone não foi atingida. Desde então, ela apresentou uma dificuldade maior na fala e para andar, como efeitos do trauma. As "sequelas que não têm volta", como definiu Cintia, incluem ainda a necessidade de Simone por usar fralda.
Um ano depois, no entanto, a família vive ainda um misto de emoções: Leonardo Peixoto, irmão de Letycia, será pai de uma menina, que nascerá neste mês de março. E o nome escolhido para o bebê é justamente Letycia, como forma de homenagear a irmã.
— Fica aquela sensação de alegria, mas com um bloqueio de saber que o Hugo (filho de Letycia) poderia estar aqui junto e que minha filha ficaria feliz de ter uma sobrinha. Por mais que seja uma felicidade, lá no fundo tem uma tristeza — relata Cintia, que define o momento como uma "mistura de felicidade e de perda": — Estou feliz pelo meu filho e pela minha nora, mas no mesmo momento (que penso) que minha filha tinha um sonho tão simples, de ser mãe, e que não realizou.
Já o pai de Letycia, Alcimar Freitas, decidiu homenagear a filha de outra forma: ele tatuou o rosto da filha em seu peito, a partir de uma foto que Letycia tirou na adolescência.
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