04 outubro 2023

Superficial e incompleto, “Ângela” não consegue contar a verdadeira história da pantera mineira

Atuação de Isis Valverde como Ângela Diniz é convincente e de total entrega à personagem, apesar do roteiro fraco (Fotos: Downtown Filmes)


Mirtes Helena Scalioni


Quem assiste à “Ângela”, sabendo apenas vagamente do rumoroso caso que abalou o Brasil em 1976, vai achar o filme fraco. Quem viu pelos jornais da época a tragédia da pantera mineira, a socialite que morreu brutalmente assassinada à queima-roupa pelo amante ciumento às vésperas de um réveillon em Búzios, talvez ache o longa fraco e vago. 

Mas, quem teve a oportunidade de acompanhar os oito episódios do podcast “Praia dos Ossos” (2020) vai sair do cinema decepcionado, certo de que a história foi muito mal contada, deixando pontas soltas, além de colaborar para que a imagem da moça seja, de novo, achincalhada, como se ela não passasse de uma mulher meio inconsequente e louca por sexo.


Responsável por algumas importantes mudanças na forma de se julgar um feminicídio, o assassinato de Ângela Diniz merecia um filme mais completo, capaz de levar a reflexões ainda hoje necessárias. Em pleno 2023, homens continuam matando mulheres como baratas porque se sentem seus donos. 

Nem mesmo o movimento feminista que, naquele tempo, mobilizou o Brasil a ponto de exigir um segundo julgamento do assassino, foi bem colocado no longa. O tal recorte dos últimos dias da pantera, escrito por Duda de Almeida e dirigido por Hugo Prata, deixa a desejar.

Ângela Diniz e Doca Street (Reprodução)

Para não ficar só na corrente do contra, talvez se possa pinçar algum mérito em “Ângela”: a atuação, convincente e de total entrega, de Isis Valverde. Apesar do roteiro fraco, a atriz mineira consegue revelar nuances de uma mulher moderna, libertária e atrevida, mas ao mesmo tempo melancólica, reflexiva e, de certa forma, solitária. 

Os aplausos podem ser estendidos também a Gabriel Braga Nunes, que faz o ciumento, agressivo e picareta Raul Doca Street, o amante assassino. 


De um modo geral, o elenco é todo um acerto, incluindo Gustavo Machado como o colunista Ibrahim Sued, Chris Couto como a mãe de Ângela, Bianca Bin como Tóia (representando todas as amigas da protagonista), Emilio Orciolo Neto como Moreau, Carolina Mânica como Adelita Scarpa e Alice Carvalho como Lili, a empregada que se torna amiga da patroa na casa de Búzios.


Quem gosta de música também vai poder observar que as guitarras falam muito alto na trilha sonora assinada por Otávio de Moraes, também responsável pelas composições de "Meu Nome é Gal". 

Belos solos embalam e preenchem cenas paradisíacas de praias, ondas que vêm e vão, sol se pondo, lua nascendo e tudo o mais necessário para ilustrar e valorizar um romance – que aliás não se concretiza com beleza – mas parece antever o trágico.

Outro detalhe que chama a atenção no filme, principalmente das mulheres: as cenas tórridas das muitas transas de Ângela e Raul são exageradas e nada plásticas. Há quem diga que nem parece paixão.


Ficha técnica:
Direção: Hugo Prata
Roteiro: Duda de Almeida
Produção: Bravura Cinematográfica, coprodução Star Productions
Distribuição: Downtown Filmes
Exibição: na sala 1 do UNA Cine Belas Artes, sessões às 14 e 18 horas 
Duração: 1h44
Classificação: 16 anos
País: Brasil
Gêneros: drama, biografia

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